O universo dos computadores, códigos e softwares foi, por muito tempo, dominado pelo gênero masculino. Ao longo da história, existiram poucas participações das mulheres na tecnologia. Algumas se destacaram, mas acabaram sendo ofuscadas pelo tempo.
No entanto, é importante destacarmos alguns nomes. Por exemplo o de Hedy Lamarr, que foi a inventora do Wi-Fi. Ou também Ada Lovelace, que, além de ser a primeira mulher programadora, foi a primeira pessoa a trabalhar com programação.
Não podemos esquecer ainda de Katherine Johnson, uma cientista que colaborou para que a NASA levasse o primeiro homem à Lua, e Grace Hopper, que desenvolveu a base para o COBOL, a primeira linguagem complexa de computador.
Apesar de ainda não termos o cenário ideal, a presença das mulheres na tecnologia está mudando. Ou melhor, ele está em crescendo. As mulheres estão cada vez mais presentes em empresas de tecnologia e fora de cargos administrativos. Entretanto, para que esse número continue crescendo, é muito importante apoios externos. Principalmente de empresas que as incentivem e criem um ambiente acolhedor.
O relatório “Mulheres na Tecnologia”, feito no último ano pelo “TrustRadius”, portal especializado em negócios do setor, mostrou que 72% das equipes de tecnologia possuem a proporção de uma mulher para cada dois homens.
A pesquisa ainda trouxe outro número preocupante. Durante a pandemia, as mulheres têm quase duas vezes mais chances de perder seus empregos nas empresas de tecnologia. Isso, comparando com as chances de um homem na mesma circunstância.
Um outro estudo, feito pela Accenture e pelo Girls Who Code, mostrou que, pelo menos, metade das mulheres na tecnologia deixam de trabalhar na área antes dos 35 anos. O principal motivo destacado por elas é a cultura empresarial que não é acolhedora.
Apesar disso, a candidatura de mulheres na tecnologia está aumentando. Nos primeiros cinco meses de 2021, 12.716 profissionais se candidataram a oportunidades no setor no Brasil. No ano anterior, no mesmo período, o número havia sido 10.375. Se forem analisados somente os números de janeiro de 2021, foram 4.316 candidatas contra 1989 no ano anterior. Isso significa um crescimento de 116%, de acordo com os dados do Banco Nacional de Empregos (BNE).
Mas você já parou para se questionar sobre quais os motivos dessa presença menor das mulheres na tecnologia? Por que temos menos mulheres na tecnologia, principalmente na área de TI do que homens?
Então, vamos pensar de forma rápida. Qual era o seu brinquedo favorito na infância? Caso você seja uma mulher, é provável que a resposta envolve panelinhas ou bonecas. Caso você seja um homem, a resposta é bem diferente. Videogames, carrinhos e computadores certamente estarão na resposta.
A divisão de brinquedos pode ser considerada natural por muitos. Porém ela reflete estereótipos de gênero que foram historicamente construídos. Neles são delegados às meninas, desde muito cedo, tarefas e interesses específicos. Geralmente voltados somente às esferas de cuidado, proteção e ao âmbito privado.
Apesar de já desbancada pela ciência, persiste ainda a ideia de que são as razões biológicas que determinam os caminhos de homens e mulheres. Ou seja, de que a mulher possui uma habilidade “natural” para as tarefas que demandam afeto e atenção. Enquanto isso, a racionalidade seria um atributo masculino.
Portanto, em razão dessa divisão, os modos de ser de mulheres e homens são influenciados. Assim, alteram-se as escolhas futuras, incluindo as profissionais. Vide o exemplo de que é incomum ver as meninas se identificarem desde cedo com carreiras que estejam relacionadas à tecnologia ou às ciências exatas.
Aliás, quando as mulheres decidem por seguir essa carreira, elas ainda sofrem preconceito. Este, muitas vezes feito por familiares, amigos e colegas, além da sociedade de maneira geral.
Mas quando começou esse processo de masculinização da tecnologia? A figura do geek antissocial começou na década de 1960. Tudo surgiu por meio da criação de programas formais das disciplinas, de revistas e de programas de certificação.
Junto a isso, os formatos de contratação reforçavam a presença dos homens no setor. Os testes privilegiavam problemas matemáticos que eram disponíveis em organizações universitárias de programadores. Bem como as avaliações de personalidade se inclinavam para perfis masculinos.
As perguntas dos testes procuravam identificar os melhores profissionais. Porém, suas referências eram os traços de personalidade de profissionais de escritórios — como advogados, contadores, etc.
Além disso, eram destacadas duas necessidades emocionais. Primeiro, o “desinteresse nas pessoas”. Além do fato de não gostar de atividades que envolvessem “interação pessoal”.
As mulheres que decidem por seguirem empresas de tecnologia normalmente se deparam com as mesmas questões sexistas enquanto tentam crescer na profissão.
A diferença salarial entre homens e mulheres na tecnologia é um dos primeiros entraves. Isso segue uma tendência que é observada em outros setores também. No entanto, na área de TI, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, as mulheres ganham até 30% menos do que os homens.
Aliás, esse ponto já foi explorado em outras pesquisas. Como as da economista americana Linda Babcock, da Universidade Carnegie Mellon, e autora do livro Women Don’t Ask. Nas suas análises foi verificado que as mulheres têm um salário menor porque estão menos propensas a negociar a proposta salarial após a primeira oferta.
No entanto, há estudos claros sobre este assunto. Eles mostram o que acontece quando ambos os gêneros se comportam de maneira assertiva durante as negociações salariais. Quando as mulheres apresentam exatamente o mesmo comportamento dos homens, elas são mal-vistas. Isso por não terem aceitado a primeira proposta e pedirem mais.
Outro desafio na carreira das mulheres na tecnologia é o formato da organização do mercado brasileiro. Aproximadamente 93% dos negócios que atuam na comercialização de softwares e hardware são empresas de pequeno e médio porte. Com isso, a dinâmica de faturamento é baseada em projetos, que são feitos um em seguida do outro, ou de forma concomitante, para que não exista a perda de clientes.
Em razão dessa estrutura, o atendimento a muitos clientes é algo que faz parte da rotina desses profissionais. Junto a isso, ainda há deslocamentos constantes e rotinas de trabalho com jornadas de 10 a 12 horas, além de prazos apertados e trabalho extra nos finais de semana e feriados.
Na finalização dos projetos e durante os testes de software, os profissionais chegam a trabalhar 72 horas seguidas — e tal situação acontece, em média, a cada três meses. O resultado de todo esse formato é a preferência por profissionais masculinos, que sejam solteiros e mais novos. Enquanto as mulheres — e pessoas com filhos — são recusadas.
Outro desafio na carreira das mulheres na tecnologia está relacionado ao dia a dia das empresa. Há companhias com discursos sobre abraçar a diversidade e lutar em conjunto pela igualdade, mas na prática é tudo diferente. Há questionamentos sobre as habilidades das mulheres, comentários maldosos e o preconceito diário.
Por fim, outro desafio das mulheres, e, neste caso, de forma geral, no ambiente corporativo está relacionada à cobrança excessiva. Desde muito novas, as mulheres são vistas como mais responsáveis e empenhadas.
Enquanto uma jovem de 20 anos é considerada uma mulher “bem grandinha”, um jovem de 20 anos é só um “menino bobinho” ainda. Esse pensamento, por inconsciente coletivo, faz com que muitas mulheres sejam cobradas excessivamente em seus cargos, como se tivessem que se responsabilizar pelos seus colegas homens.
A participação das mulheres na tecnologia é um ponto importante no combate à naturalização dos papéis de gênero. Assim como serve para estimular ambientes de trabalho com diversidade.
Além disso, o crescimento econômico sustentável também depende da participação e do envolvimento das mulheres em diferentes áreas, incluindo a tecnologia. O setor é um dos principais responsáveis por gerar postos de trabalho, mesmo com a atual crise econômica.
Outro aspecto positivo é que a tecnologia possibilita a geração de renda e de emancipação econômica às mulheres. Mesmo com a diferença salarial de gêneros, o setor remunera melhor as mulheres do que outros que já costumam contratar mão de obra feminina.
Inclusive, há um relatório global da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de 2017 que mostra que a economia brasileira poderá expandir até R$ 382 bilhões ao longo de oito anos, caso aumente a presença das mulheres no mercado de trabalho. Isso significa que poderia haver um incremento de 3% ao PIB, aumentando o poder de consumo de bens e serviços.
As organizações que possuem diversidade de gênero e de etnia possuem um retorno financeiro acima da média nacional. Além disso, outro aspecto fundamental da presença feminina nas empresas é a questão de as organizações terem novos olhares e novas percepções diante de produtos.
Com isso, as mulheres se apropriam da tecnologia como produtoras e não somente como consumidoras. Dessa forma, elas têm a oportunidade de resolver problemas próprios da sua condição, evitando as distorções em aplicativos de saúde, por exemplo. O Health, da Apple, só passou a contemplar o ciclo menstrual depois de muita polêmica.
Um dos pontos mais importantes no que tange à presença das mulheres em empresas é a sororidade — independentemente de qualquer área, incluindo as de tecnologia. Quanto mais apoio as mulheres têm pela igualdade de gênero nas profissões e no salário, mais é fomentada a movimentação feminina no mercado.
De acordo com um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se o ritmo de participação das mulheres continuar o mesmo, o gênero feminino no mercado de trabalho brasileiro deve crescer mais do que o masculino em muitas áreas nos próximos anos, incluindo a de ciência e tecnologia.
Outro ponto importante para a sororidade nas empresas é com relação à divulgação das oportunidades de mulheres no mercado de trabalho. Isso deve ser ainda maior para que elas possam se sentir confortáveis para se inscrever e ocupar posições.
Um exemplo é o filme “Estrelas Além do Tempo”, que mostra a história de três mulheres negras que trabalhavam na NASA. Ao longo do filme, elas conquistaram espaço e superaram as adversidades impostas pela sociedade na época.
Nas empresas, por exemplo, é essencial a criação de comitês que tenham como objetivo a melhoria da experiência profissional das mulheres. Além disso, é fundamental que as empresas escutem o que suas colaboradoras têm a dizer — isso é uma estratégia assertiva para haver mais igualdade.
Entre outras situações que as empresas podem adotar para garantir um ambiente acolhedor estão:
A contratação das mulheres em determinadas áreas não deve se limitar a poucas colaboradoras. Ou seja, isso significa que é importante apostar na presença de várias mulheres. Isso garante que elas se sintam fortalecidas e representadas na rotina do ambiente corporativo.
As empresas também podem promover treinamentos e palestras sobre a importância das diversidades nos setores, provocando reflexões sobre machismo e os desafios que as mulheres ainda enfrentam no ambiente profissional. Inclusive, esses eventos podem acontecer mesmo que os profissionais estejam em home office.
As dificuldades para se impor em ambientes masculinos e a identificação de ambientes tóxicos podem fazer parte da realidade de muitas mulheres. Portanto, é essencial que as lideranças e o RH as escutem sobre essas questões para poder acolher as colaboradoras da melhor forma.
Muitas pessoas confundem o termo empoderamento, o vinculando a privilégios. Mas o termo tem conexão com a consciência coletiva, expressando ações que devem ser feitas para fortalecer as mulheres e promover a igualdade de gêneros.
A prática é essencial para contribuir com a sociedade e também com o ambiente corporativo. Inclusive, diante de tantos obstáculos enfrentados pelas mulheres, a ONU Mulheres e o Pacto Global criaram os Princípios de Empoderamento das Mulheres.
Eles têm como objetivo principal a implementação de ações a práticas que tragam como resultado maior igualdade de gênero — especialmente no ambiente de trabalho. Os sete princípios são:
É necessário colocar em prática esses princípios para gerar a equidade de gênero no universo empresarial. Com isso, os desafios enfrentados pelas mulheres diariamente irão diminuir gradativamente.
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